Nessa edição de matérias sobre os 10 anos do Produtor de Água do Pipiripau, conheça a história de como surgiu a proposta do programa no Distrito Federal e a importante contribuição de duas personalidades representando a Agência Nacional de Águas (ANA), instituição criadora do Programa Produtor de Água no Brasil.

Devanir dos Santos quando ainda atuava na ANA. Foto: ANA
O projeto Produtor de Água no Pipiripau teve seu primeiro contrato assinado em 2012, mas a concepção começou anos antes, por volta de 2007 e, entre os motivadores, estava umaemanda da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) em acompanhar mais de perto a execução de um desses projetos do programa Produtor de Água. Nesse contexto, a atuação do engenheiro agrônomo e especialista em Projetos de Pagamento por Serviços Ambientais, Devanir Garcia dos Santos fez toda a diferença.
Devanir foi um dos idealizadores do Programa Produtor de Água dentro da ANA e trabalhou na coordenação desse programa por quase 20 anos. Mesmo depois de mudar de instituição, sua atuação trouxe importantes contribuições para a continuidade do projeto no Distrito Federal.
Criado nacionalmente pela ANA em 2001, o Programa Produtor de Água tem foco no estímulo à política de pagamento por serviços ambientais (PSA), que recompensa os produtores rurais por ações de conservação de água e solo. Após o sucesso da implantação do projeto Produtor de Água em Extrema (MG), na região bacia hidrográfica dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ), a ANA sentiu a necessidade de criar um projeto que estivesse mais perto da sede e que servisse de vitrine para difundir a iniciativa.
“Na época, Brasília passava por uma crise muito forte de abastecimento na região norte, em Planaltina e Sobradinho”, conta o ex-representante da ANA. A agricultura havia crescido muito na região e se continuasse a ser desenvolvida daquela forma, sem sustentabilidade, havia uma perspectiva de colapso. “As vazões estavam decrescendo em função da ocupação da área agrícola desordenada”, relembra.
Assim, a bacia hidrográfica do rio Pipiripau mostrou-se o local ideal para esse novo projeto. Era uma bacia próxima a Brasília, de fácil acesso, com série histórica de contabilização de vazão e chuvas, além da importância estratégica em virtude do conflito pelo uso da água entre irrigantes e a companhia de abastecimento. A perspectiva era que o projeto poderia ajudar nesse conflito e virar um modelo para o Brasil.
Devanir Garcia Santos trabalhou na implantação do Projeto no Pipiripau com a organização da Unidade de Gestão do Projeto (UGP) e na elaboração do primeiro regimento interno. Atuou no dia a dia do projeto até 2015, buscando agregar e motivar parceiros. Hoje, já são mais de 50 projetos Produtor de Água pelo Brasil que visam à redução da erosão e do assoreamento de mananciais no meio rural, melhorando a qualidade e a oferta de água, beneficiando mais de 35 milhões de pessoas das regiões metropolitanas de São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Palmas (TO), Rio Branco (AC), Campo Grande (MS), Goiânia (GO) e Brasília (DF).
“O projeto no Pipiripau mostrou a importância do arranjo institucional. Temos um arranjo factível e consistente, que conseguiu congregar mais de 10 instituições por mais de 10 anos no mesmo objetivo”, disse Devanir. “Todo mundo se sentiu confortável em fazer parte. O projeto não tem um único dono. Nunca houve um arranjo com tantas instituições em tanto tempo”, destaca.

Rossini Sena em evento do Produtor de Água. Foto: ANA
Em parceria nesse trabalho o especialista em Recursos Hídricos e Saneamento Básico Rossini Ferreira Matos Sena também se envolveu na implantação do projeto no Distrito Federal e se tornou o representante da ANA na UGP, onde atua até hoje. Na avaliação dele, o Pipiripau cumpriu o objetivo de se tornar um projeto vitrine e sua atuação hoje inspira o Produtor de Água do Descoberto, recém implantado no DF.
Rossini concorda que um ponto forte do projeto é o envolvimento dos parceiros. “A gente conseguiu uma grande quantidade de parceiros de primeiro time, cada um ajudando com seu conhecimento em sua área”, aponta Rossini. Como resultado, o projeto conseguiu realizar muitos estudos, ter recursos para diversas atividades, grandes números no plantio de mudas e na realização de terraceamento, além da melhoria nas estradas.
Rossini também destaca que o Pipiripau se tornou uma grande sala de aula. Durante o Fórum Mundial da Água realizado em 2018 em Brasília, a região recebeu representantes de mais de 20 países interessados em conhecer a iniciativa. “Nós também conseguimos fazer o livro sobre o projeto, bilingue, que considero a melhor bibliografia sobre o Programa Produtor de Água”, relata. Outro ponto forte do projeto é a Unidade de Gestão do Projeto (UGP), que tem reuniões frequentes, o lançamento de editais e grande atuação dos parceiros.
“É um modelo de projeto, tanto na parte estrutural e burocrática, como nas ações em campo. Os produtores rurais elogiam o projeto do Pipiripau. Para nós foi e é um caso de sucesso”, afirma Rossini. “Quando o projeto foi criado, a gente pensou em melhorar a infiltração e diminuir o assoreamento, mas ele foi muito além disso”, completa.
Devanir também reconhece que o projeto foi além. “Com o projeto, nós saímos de um modelo de agricultura que trazia problemas para o abastecimento da bacia, e evoluímos para uma agricultura orgânica, que é muito importante para aquela comunidade, é uma nova alternativa”, afirma Devanir.
Após a saída da ANA, Devanir foi superintendente de Planejamento e Programas Especiais na Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa), onde atuou na elaboração da resolução que permite que a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) possa reconhecer na tarifa de água e esgotamento sanitário seus custos com Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Com a Resolução nº 04, de 19 de abril de 2021, Adasa, até 0,2% da arrecadação tarifária poderá ser utilizada em programas e projetos que se enquadrem na Política Distrital de Pagamentos por Serviços Ambientais. Com isso os pagamentos têm um orçamento garantido.
Atualmente Devanir é consultor no projeto Café Produtor de Água, que busca por sustentabilidade na cadeia produtiva de café e a revitalização de mananciais, realizado em parceria com o Conselho Nacional do Café e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Para o futuro, Devanir espera a perpetuidade do projeto. “O nosso sonho desde o início foi ter recursos para remunerar adequadamente os produtores rurais pelos serviços ambientais. A gente sabe que isso ainda está distante, mas com a resolução da Adasa e os recursos da Caesb, você tem recurso para pagar e dá um horizonte para o produtor de que ele vai continuar recebendo”, destaca.
Para Rossini, o progresso do Projeto Produtor de Água no Pipiripau é um caminho sem volta e a gestão o seu maior ganho. “Eu vejo que os parceiros são muito envolvidos, a capacidade técnica é elevada, os produtores estão satisfeitos. Estamos no caminho certo”, afirma.
Texto: Natália Sampaio/ANA